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sábado, 3 de abril de 2021

Trevas na Terra de Santa Cruz

Aparição Na Quaresma



Me recuperando na ala medica daquele destacamento, ossos sarados, ferimentos fechados, decidi que ficaria e participaria daquela batalha, ainda que a potencia dos meus músculos fosse grande e minha experiência me ajudasse a verdade é que estou velho, ciente que as chances de sair vivo dessa guerra são menores do que as de um jovem contudo a verdade é que todo mundo morre de alguma coisa e não adianta viver com medo da morte, mesmo o imperador Dom Pedro esta nessa batalha o que me surpreendeu, não imaginava que existissem governantes que defendessem seu povo fora dos livros, talvez o mundo não seja tão escuro quanto eu sempre achei, ou talvez eu sempre tenha andado com a cara enfiada demais na escuridão. 


Armas sempre foram minha companhia e ainda que não fosse um dos soldados facilmente consegui ingressar na guarda de milícia não treinada do exercito, homens simples e corajosos, almas gentis e sofridas que pegaram em armas devido a ameaça a sua terra e sua gente, o companheirismo nasce rápido entre combatentes e logo me vi dividindo historias de minhas andanças as que eles mais gostam são dos encontros estranhos com as feras dessa terra, monstros com pouca ou nenhuma explicação e me vi contando uma historia a qual ainda não havia escrito em meus textos, estarei aqui reparando tal deslize.


Foi no sertão do Maranhão onde se passou essa historia, uma ex freira chamada Ana Luisa que abandonou o habito para se casar com um homem ao qual se apaixonou e teve uma filha, havia sido deserdada pelos pais, por oito anos viveram juntos embora a relação rapidamente definhasse, o homem ao qual havia se apaixonado, Roberto, ciumento e possessivo morava com sua esposa e filha em um sitio afastado de quase tudo a 8km da vila mais próxima e ainda assim acreditava que sua mulher lhe traia, abandonando-a gravida de seu segundo filho. Mãe e filha sozinhas e abandonadas no sitio viviam como podiam e acabou por fazer o parto sozinha tendo como única ajuda sua menina mais velha, parto difícil e com grande perda de sangue havia deixado Ana Luisa doente e com 3 meses após o parto ainda demorava a se recuperar, nessa época eu me vi batendo em sua porta.


Vindo em busca de orientação, encontrei a mulher enfraquecida, o jovem bebe ao qual tinha chamado de João e sua pequena filha Tereza ao que vim descobrir depois de ouvir a historia completa, cuidando de todos os afazeres da casa, não consegui partir dali dando as costas aquelas duas, fiquei e ajudei, embora não tenha sido tão útil quanto gostaria de ter sido, caçava, conseguia alguma comida mais Tereza é quem realmente cuidava de sua mãe que mau se sustentava em pé no tempo que fiquei ali, com tonturas e fraqueza as vezes desmaios, sempre era a menina que estava ali para socorrer sua mãe e cuidar dela, um mês após eu chegar, quatro após o parto, entrava a quaresma e a mulher lentamente começava a mostrar melhoras.


Na noite em questão para o conto estava eu bebendo do lado de fora da casa, Tereza lavava os pratos e copos pois a pia também ficava fora da casa que pequena e com chão de palha e barro, se molhada seria complicado para limpar, deveria ser oito horas da noite, não fazia tanta diferença, senti algo me olhando da mata, algo que atiçou meu instinto e lentamente pegava minha pistola de pederneira do meu cinto e a deixava sobre a coxa e falei a pequena Tereza.


- Va para dentro de casa e cuide de sua mãe e do bebe, deixe esses pratos ai, de manha se resolve isso a noite esta fria e se ficar doente quem cuida da casa? - disse com certa urgência embora tentando me manter calmo mesmo que meu corpo falasse que deveria me erguer e me posicionar para o enfrentamento.


- Mas os pratos sujos vão atrair os bichos - me respondeu a pequena ao que lhe respondi


- Vai, eu vou ficar aqui fora hoje, fazer uma fogueira, beber um pouco, com o fogo nenhum bicho vai chegar perto da casa - e a menina cansada foi se deitar para dormir, lembrei-a de trancar a porta e quando ouvi o trinco sendo passado juntei madeira como disse que faria e ascendi uma fogueira mantendo a calma mais mantendo também a atenção em todo lugar.


O fogo nem havia pegado ainda quando senti cheiro de enxofre e já atirei mil balas para saber bem como é o cheiro quando a pólvora queima, ouvi um rosnado leve e com as chamas ainda mansas atrás de mim me virei para encarar a escuridão sacando o facão da bainha e apontando a arma para a noite, luzes que depois vi serem olhos, me encaravam no escuro, sem medo da fogueira ou das chamas a coisa andava ao meu largo, ou seria ao largo da casa? Parecia um grande cão com aspecto demoníaco, um largo sorriso era discernível em seu rosto, já havia enfrentado um lobisomem a essa minha altura da vida, estava pronto pra o ataque, para me machucar para pagar sangue pela vitória, so não para ouvir o monstro falando.


- Vim pela criança pagã - me disse o monstro enquanto a escuridão parecia o abraçar sem contudo diminuir o brilho de seus olhos ou de seus dentes.


- Não tem criança pagã aqui, vai embora - disse eu forçando a voz para não falhar, não veio em minha mente uma ameaça, um brado de heroísmo ou algo épico, ainda me desconcertava que aquilo tão inumano estivesse conversando comigo.


- Te deixo viver se trazer a criança - me falou o cão novamente - a mulher lá dentro é nova, pode ter mais filhos - ele parecia me medir, talvez tenha notado que minha postura fosse de guerreiro, ou notou meu sangue mestiço que me tornava mais difícil de derrubar que os descendentes puros dos Lusitanos, verdade seja dita, minha ascendência Tupi em muitas vezes já tinha me salvado.


- So vai passar comigo morto - falei em um rugido, ele sabia do bebe então não tinha porque continuar a tentar engana-lo mais a fera dizia - o filho nem é seu, vocês viventes se apegam a tudo que se move... O rebentozinho nem possui o saber ainda, mais não pense que vai se safar apenas porque consegue correr mais - foram as ultimas palavras do monstro para mim, nesse momento a escuridão o abraçou e num instante depois ele havia saltado sobre mim, atingindo meu ombro e quase meu pescoço, rasgando carne, raspando em ossos com os dentes, o joguei para traz com um golpe do facão que não o cortou, pele dura, pelo estranho e afiado, mais o golpe não foi inútil, se contorcendo de dor como que houvera levado um golpe de porrete vi o monstro afastando-se para reavaliar a estratégia e eu contudo não ia deixar ele ter iniciativa novamente, não sentia dor , não ainda e não havia de deixa-lo atacar novamente, ataquei mais atingi apenas o ar da noite.


O grande cão estava no topo da casa tentando afastar as telhas com as garras e ouvi o grito de Tereza e Ana Luisa, mirei com a mão ferida e atirei, o monstro grunhiu e sangrou, correu rápido para longe, a força do tiro fora o suficiente para o ferir mais sabia que não havia lhe matado, de manha mesmo ferido, praticamente carreguei Ana Luisa, Tereza e o pequeno João para a igreja do vilarejo onde o menino fora batizado e já na luz das estrelas, entre as trevas fora da igreja podia ver as luzes dos olhos do enorme cão, não sei o que foi aquilo, mais nunca mais o vi.