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sexta-feira, 12 de julho de 2019

Trevas na Terra de Santa Cruz


Assombração da Fazenda dos Patos

Mesmo agora velho eu não paro minhas viagens, ando em meio as antigas trilhas dos peabirus e pelo norte e nordeste, mestiço e sem lugar em cidades grandes, ainda que alguns apreciem meus textos muitas vezes fico melhor com o reconhecimento a distancia, não existe lugar para mim entre as pessoas das cidades que mesmo que hoje cultuem uma figura idealizada do bandeirante em verdade nunca gostariam de encontrar um ainda que em condições de amizade, para que o ufanismo não morra diante de uma figura real e falha como qualquer ser humano, essas minhas viagens me trazem as recordações para escrever as anotações históricas, mais me recordam de historias que vi em meus longos anos de vida, embora também nunca tenha de fato abandonado as armas, uma vida inteira de violência deixa cicatrizes, marcas de caráter, hábitos e inimigos. De modo que mesmo em tempos de viajante e estudioso não posso me dar ao luxo de vagar sem o fuzil ou pistola alem de outras armas, muitos perigos rondam essas estradas e maldições estranhas se deitam sob essas terras, dividirei com vocês um dos casos mais estranhos que vi e tive a sorte de sobreviver para contar.

Viajava por Alagoas, perto da fazenda dos Patos que ate então eu não sabia que existia, viajava por trilhas antigas, indígenas e pouco usadas justamente para evitar bandoleiros, esse tempo é perigoso com cangaceiros e jagunços percorrendo pelas estradas do nordeste e precisariam apenas de uma desculpa pequena para matar qualquer viajante, já preparava para comer algo, mesmo que a noite estivesse fria não me sentia com coragem de ascender um fogo visto que estava em campo aberto, fui surpreendido com um homem chamando minha atenção, ele me questionou sobre quem eu era, porque estava tão longe da cidade, falava que estava indo para a mesma quando a noite me pegou e precisei parar, fui convidado para dormir numa fazenda perto, o homem se identificou como Domingos, um vaqueiro que trabalhava na dita fazenda e disse que poderia dormir em uma cama e pela manha seguiria viagem, sabendo da gentil e hospitaleira gente dessa terra, pensei , porque não?

Seguindo o caminho a noite ia ficando mais fria, contudo ao chegar na fazenda fiquei surpreso, o local parecia abandonado, não havia plantações perto, sinais de criação de animais de qualquer tipo, apenas uma tapera caindo aos pedaços no centro do terreno delimitado com uma cerca que já falhava na maioria de sua extensão, perguntei ao homem que tipo de trabalho ele fazia ali contudo ao me virar para ele o mesmo estava em pé as minhas costas sem a cabeça, saquei o machado e a pistola, o golpe desfez a criatura a minha frente como se ela fosse feita da substancia da noite e para ela tivesse voltado.

A esse momento preferia ser encontrado pelos bandidos que por qualquer monstruosidade, quebrei uma garrafa de cachaça e joguei o liquido por um arbusto morto perto, risquei a pederneira e vi a fogueira de palha começar a queimar iluminando o negrume, nenhum sinal de criaturas, joguei algumas tabuas velhas na fogueira na esperança do fogo se manter contudo estava em conflito na minha mente, correr para o sertão seria perigoso no escuro, qualquer coisa poderia me ocorrer ali. Longos foram os segundos em que eu observava a escuridão em busca de um sinal para atacar, gritos começaram a soar da tapera e me voltei para ela apontando a pistola, minhas mãos já não tinham firmeza e o medo percorria meu corpo e gelava meu sangue retirando a força dos meus músculos, uma risada que cortava a noite quase me fez cair, juntando o quanto de coragem me sobrava gritei, chamando Domingos de covarde e comandei para que aparecesse a minha frente – Não sou Domingos, sou o Diabo – me respondeu uma voz vinda do interior da tapera – Eu mando nessas terras e sua presença já começa a me incomodar – joguei um toco de tabua em chamas para a entrada da velha construção me deparando com uma figura sinistra, com gibão de couro, um cangaceiro saído de pesadelos, atirei e o ataque nada fez contra a criatura que me atacou com uma peixeira. A madeira do meu machado não conseguiu conter aquele golpe e senti ele gelar minha pele, não era como o toque de uma lamina contudo ainda assim sangrei pelo ferimento provocado, vendo que não teria chances ali abri mão de minha cautela e fugi para o serrado.

"Bandido bom é bandido morto?"


Corri a por muito tempo a noite e podia ouvir ao longe a risada daquela fera sobrenatural, ao chegar na primeira cidade e falar sobre o que aconteceu foi me falado sobre a fazenda dos Patos, local assombrado onde Corisco, o diabo loiro, degolou 6 pessoas inocentes que ele jurava terem sido responsáveis pela morte de seu chefe, lampião, que morrerá poucos meses atrás. Se foi punição divina que prendeu Corisco naquele lugar amaldiçoado ou se foi uma peça pregada por divindades negras que ainda estão ofendidas pela tomada dessas terras, não sei dizer, assim como não sei dizer se alguém vai poder voltar a viver na Fazenda dos Patos

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